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PROJETO SUBORDINA AGÊNCIA E AUTARQUIA A MINISTRA DA AGU

Antes de ser denunciado por um colega, em novembro do ano passado, o então ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, pretendia resolver na Advocacia-Geral da União (AGU) uma desavença pessoal com o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan), autarquia que havia embargado a obra do prédio onde ele tem um apartamento de luxo.

Pelo caminho natural, haveria uma disputa jurídica entre a AGU e o procurador federal responsável pelos interesses do Iphan. A necessidade dessa discussão, contudo, pode ser abolida caso passe no Congresso um projeto de lei que coloca sob as ordens diretas da Advocacia Geral da União os órgãos jurídicos das mais de 150 autarquias, fundações, agências reguladoras e universidades federais.

Tramitando em regime de urgência na Câmara, o Projeto de Lei Complementar foi apresentado no apagar das luzes de 2016 pelo governo. Sua proposta principal é inserir a Procuradoria-Geral Federal e a Procuradoria-Geral do Banco Central como órgãos de direção superior da AGU. Em linhas gerais, as duas procuradorias deixariam a condição de órgãos vinculados e passariam a ser diretamente subordinados ao AGU.

Nessa condição, o processo sobre o edifício de Geddel poderia ter sido resolvido com uma canetada do ministro da AGU, sem a necessidade de embate jurídico com o Iphan. “Não é raro que autarquias e agências reguladoras defendam interesses divergentes do governo central. Esse projeto retira a autonomia jurídica desses órgãos, submetendo à vontade política do governo”, explica Caio Wolff, diretor da Associação Nacional dos Advogados da União (Anauni).

A entidade, que tem cerca de 1 mil associados, cita vários outros exemplos de possíveis interferências do Executivo nas autarquias, como cobrança de multas das operadoras de telefonia ou das distribuidoras de energia elétrica pelas respectivas agências reguladoras. “Em alguns casos, será como colocar acusação e defesa sob o mesmo comando”, explica a Anauni.

Apesar da divergência frontal sobre o mérito do projeto, a associação ataca mais severamente a forma pela qual a matéria tramita. Para Caio Wolff, não há outra explicação para a adoção do regime de urgência que não seja um objetivo claro de evitar a ampla discussão da matéria com a sociedade.

Responsável pelo pedido de urgência, o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) disse ao Valor que atendeu a um apelo pessoal da ministra da AGU, Grace Mendonça, e que a matéria já estaria “pacificada”. Recentemente, a própria ministra defendeu a urgência, que segundo ela é “fundamental para viabilizar uma advocacia pública integrada e qualificada”.

Na exposição de motivos do projeto, Grace justifica apenas a necessidade de uma reorganização da Lei Orgânica da AGU, especialmente no que se refere à unificação das carreiras na advocacia pública. Sobre a possibilidade de interferência no trabalho das autarquias, a AGU diz que já realiza, “sem qualquer tipo de ingerência”, a supervisão técnica e jurídica do trabalho dos procuradores.

“O trabalho é integrado e feito com o objetivo de traçar a melhor estratégia em defesa do interesse público. Não à toa, os membros das respectivas carreiras não somente apoiam, como têm se apresentado como os principais interessados na aprovação do projeto”, diz nota encaminhada pela AGU.

De fato, uma das mais importantes associações de servidores apoia o projeto de lei. A Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe), com mais de 3 mil integrantes, afirma que as autarquias e fundações não gozam de independência formal e que o projeto de lei apenas proporcionará “coesão da atuação da advocacia pública federal também no âmbito da administração indireta”.

Vice-presidente da Anafe, Rogério Filomeno argumenta que a oposição ao projeto parte de advogados da União que não querem perder espaço na AGU com a inclusão dos procuradores federais na carreira. Questionado sobre o caso de Geddel, ele disse que o debate correria por várias instâncias até chegar à mesa da ministra da AGU.

Em um parecer encomendado pela Anauni, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto conclui que a AGU não tem competência constitucional para representar judicialmente e extrajudicialmente as autarquias e fundações federais. Essa vedação, segundo ele, não pode ser contornada “por meio de lei unificadora das carreiras”.

Fonte: Jornal Valor Econômico – link da matéria: clique aqui