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Observamos, de quando em vez, grande alvoroço e preocupação por parte de autoridades administrativas que recebem ordem judicial de cumprimento de obrigação de fazer em prazo determinado, sob pena de multa diária, nos termos do art. 644 do Código de Processo Civil.

Infelizmente, também já observamos referida multa ser incluída em precatório, aumentando sobremaneira a dívida do ente público executado. Em realidade, a multa do art. 644 do CPC é incompatível com a sistemática de atuação dos órgãos públicos.

Senão, vejamos.

A Administração Pública, inserta no Estado democrático de direito, deve zelar pelo pronto cumprimento das ordens judiciais. A autoridade administrativa competente tem que obedecer o comando jurisdicional tão logo tome ciência do respectivo mandado, não podendo, ela mesma, opor-se à voz do Estado-juiz.

Em via de regra, pois, ordem judicial é para ser cumprida. Eventual suspensão da ordem só pode ser perseguida no próprio Judiciário, sendo inconstitucional a conduta do agente público que retarda, propositadamente ou por desleixo, o cumprimento de um mandado judicial. Da mesma forma, é ilegal a protelação de tal cumprimento até o chamado último instante, condicionando a atenção ao comando judicial à imposição de sanção.

Assim, ficam alertadas as autoridades administrativas de seu dever de dar fiel e imediato cumprimento às ordens judiciais. Tal advertência é feita porque apenas a autoridade administrativa pode ser responsabilizada pelo descumprimento (ou não cumprimento) de ordem judicial.

Nesse contexto, não cabe a penalização da pessoa jurídica de direito público por ato ilegal de seus agentes, razão pela qual não se aplica, contra ela, o disposto no já citado art. 644 da Lei

Instrumental Civil.

Na execução de obrigação de fazer ou não fazer, inconcebível é a fixação de multa diária contra a Fazenda Pública, pela própria natureza jurídica da pena pecuniária, que tem por escopo constranger o devedor a cumprir, efetiva e definitivamente, a obrigação.

Com efeito, a finalidade da multa afasta, por si mesma, a sua aplicabilidade na execução contra a União e demais entes de direito público. Isso porque o ente público não deixa de cumprir uma ordem judicial por conta de injustificada resistência, ou mesmo por “birra” ou retaliação contra a parte ex adversa. Esses sentimentos e comportamentos, típicos da pessoa humana, são os verdadeiros alvos da multa em sede de cumprimento de obrigação de fazer.

Ora, não se concebe que tais motivações possam imprimir a conduta da Administração, que rege-se, dentre outros, pelo princípio da impessoalidade (art. 37, caput da Magna Carta).

Se, portanto, o Estado-administração não consegue cumprir uma obrigação de fazer no prazo

concedido pelo Poder Judicante, tal não se dá, em tese, por razão outra que não invencíveis

dificuldades operacionais e/ou materiais.

Se qualquer sentimento pessoal houver para, deliberadamente, descumprir uma ordem judicial,

por ele será responsável o agente público, pessoa física, que deverá responder por sua

conduta contra legem, inclusive criminalmente (crimes de prevaricação ou de desobediência,

dependendo da corrente doutrinária a que se filiar o intérprete da lei penal).

O que não se pode admitir é a utilização de um instrumento processual para constranger a

Fazenda Pública, pela força da pecúnia, não a cumprir um julgado, mas a fazê-lo num prazo

específico que, muitas vezes, é incoerente com a realidade administrativa.

Além do mais, a prevalência do interesse público também respalda a não aplicação da multa

em comento, lembrando que, nos cofres públicos, estão as moedas do já desvalido bolso do

cidadão.

O entendimento aqui exposto já foi endossado pelas Cortes federais, a exemplo da decisão nº

373/00, de 15 de junho de 2.000, prolatada, nos autos do Agravo de Instrumento nº

2000.01.00.076410-7/DF, pelo juiz Luciano Tolentino Amaral (TRF da 1ª Região) e ementada

nos seguinte termos, ipsis litteris:

“EXECUÇÃO DE SENTENÇA: APROVEITAMENTO DE FISCAIS DE TRIBUTOS DE AÇÚCAR

E DO ÁLCOOL NO CARGO DE AUDITOR FISCAL DO TESOURO NACIONAL – CITAÇÃO

PARA EXECUÇÃO COM APLICAÇÃO DO ART. 644 CPC, FIXANDO MULTA DIÁRIA, APÓS

O DECURSO DE PRAZO PARA CUMPRIMENTO DO ACORDÃO EXEQÜENDO –

IMPOSSIBILIDADE – PRECEDENTES DA 1ª TURMA DESTE TRF.”

Patente, pois, a inaplicabilidade do art. 644 do Código de Processo Civil às execuções de

obrigação de fazer contra a Fazenda Pública, pelo que recomendamos aos militantes na

advocacia pública que ataquem toda e qualquer ordem judicial que contrarie esse

entendimento.

Brasília (DF), dezembro de 2.000.

Autor:

Milton Toledo Junior – Advogado da União