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O estudo da proteção ambiental tem como pressuposto uma análise necessariamente transdiciplinar, por meio da qual profissionais e estudiosos das mais diversas áreas do conhecimento possam discutir acerca de temas complexos e apontar soluções na preservação dos recursos naturais.

A educação ambiental tornou-se uma preocupação por volta da década de 70, surgindo como uma necessidade inquestionável para suprir uma carência no sistema educacional então existente.

No calor dos debates daquela época, foi convocada pela ONU, em 1972, a I Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, em Estocolmo. Dentre as recomendações aprovadas, algumas já se referiam à educação ambiental. Todavia, foi apenas em 1977, na Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental de Tbilisi, que pela primeira vez ficou explícita a necessidade de se abordar a educação ambiental dentro de um contexto integral, considerando-se, de forma igualitária, o meio social, cultural e ecológico (Vianna, 1994).

A partir daí, a educação ambiental passa a ser pensada de um novo ângulo, como um projeto transformador, crítico e político, preparando o indivíduo mediante a compreensão dos principais problemas do mundo contemporâneo, possibilitando-lhe conhecimentos técnicos e qualificações necessárias para desempenhar uma função produtiva, com vistas a melhorar a vida e proteger o meio ambiente.

Da lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA (2002), extrai-se que a crescente intensidade dos desastres ecológicos despertou a consciência ambientalista ou a consciência ecológica por toda a parte, chamando a atenção para o problema da degradação e destruição do meio ambiente, natural e cultural, de forma sufocante.Daí proveio a necessidade da proteção jurídica ao meio ambiente, com o combate pela lei de todas as formas de perturbação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, de onde foi surgindo uma legislação ambiental em todos os países.

Nessa perspectiva, as leis ambientais, entendidas como “Direito do desenvolvimento sustentável” pela moderna doutrina norte-americana e canadense, tem como base não a tentativa de corrigir impactos que já ocorreram, mas a tentativa de ações preventivas (e não simplesmente reparadoras), imprimindo um papel notadamente educativo, na busca de uma conscientização ao meio ambiente equilibrado.

A correta compreensão das leis ambientais no Brasil é um caminho que pode contribuir para o desenvolvimento sustentável do meio ambiente, uma vez que o novo conceito que vem sendo desenvolvido é aquele que prefere atribuir ao Direito Ambiental a designação de “Direito do Desenvolvimento Sustentável”, voltado para ações preventivas e não reparadoras. Conforme afirma Sachs (1993):

“… a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais – IUCN (1991) – considera desenvolvimento sustentável o processo que melhora as condições de vida das comunidades humanas, e ao mesmo tempo, respeita os limites da capacidade de carga dos ecossistemas”.

Já nas palavras de Edis Milaré, o “… desenvolvimento sustentável ou ecodesenvolvimento consiste na possível e desejável conciliação entre o desenvolvimento, a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vidatrês metas indispensáveis.”

Ainda segundo Sachs (1993), cinco dimensões de sustentabilidade devem ser consideradas ao se fazer o planejamento para o desenvolvimento: sustentabilidade social, sustentabilidade econômica, sustentabilidade ecológica e sustentabilidade espacial.

Pensamos que a correta compreensão das leis ambientais no Brasil é um eficaz instrumento da política de educação ambiental, operando efeitos nas cinco dimensões apontadas acima. Além disso, como ensina Genebaldo Freire Dias (1994), “a chave para o desenvolvimento é a participação, a organização, a educação e o fortalecimento das pessoas” (grifo nosso).Isso, pois o desenvolvimento sustentado não é centrado na produção, mas sim nas pessoas.

Assim, tendo a legislação ambiental importante caráter educativo na prevenção da degradação ambiental e na busca do desenvolvimento sustentável, a educação ambiental deve integrar o conhecimento e o respeito a essas leis, buscando a construção de agendas ambientais por meio de um processo participativo que possibilite o aprendizado das mais diversas questões relacionadas ao meio ambiente.

Conforme o magistério de Carlos Hiroo Saito, apud Ruscheinsky (2002):

“Dentro dos fundamentos da Política Nacional de Educação Ambiental, identificam-se quatro grandes desafios para a educação ambiental no País: busca de uma sociedade democrática e socialmente justa, desnivelamento das condições de opressão social, prática de uma ação transformadora internacional, necessidade contínua de busca de conhecimento. Os quatro desafios articulam-se entre si e voltam-se, no conjunto, para o fortalecimento do exercício de cidadania como expressão da construção de uma sociedade mais justa e igualitária”.

Ora, a mudança do foco da educação ambiental da visão puramente naturalista, de admiração da paisagem natural, para a concepção de uma sociedade democrática e socialmente justa passa, necessariamente, pela idéia de que a sociedade ambientalmente equilibrada só teria espaço com a busca de uma sociedade igualitária e democrática, servindo a lei como instrumento hábil a concretizar o processo de educação ambiental e a conscientização dos indivíduos rumo à sustentabilidade. Como afirma Freire (1987):

“(…) através da educação, podemos de saída compreender o que é o poder na sociedade, iluminando as relações de poder que a classe dominante torna obscuras. Também podemos preparar e participar de programas para mudar a sociedade”.

Vale lembrar, ainda, que a promoção da consciência crítica, propiciando adoção de novos valores; o fornecimento de conhecimentos técnicos que levam à mudança de atitude e comportamentos frente ao meio-ambiente; e a participação de grupos sociais e indivíduos na gestão do meio ambiente podem ser alcançados através do conhecimento das leis ambientais, uma vez que a educação ambiental possui enfoque claramente multi, interdisciplinar e transdisciplinar, que permite não só ações individuais e coletivas, mas também ações estatais, ou seja, impostas pelo Poder Público.

Outro aspecto importante é que apenas por meio da educação ambiental se pode atingir a ruptura do antropocentrismo presente no ordenamento jurídico e a forma pela qual o homem se relaciona com o meio ambiente.

O despertar de uma nova consciência ecológica surge na medida em que a visão do homo mensura vai sendo gradualmente superada. A ação predatória do homem sobre a natureza durante milênios e a inexistência de um pensamento voltado ao respeito para com o meio ambiente natural culminaram em uma situação insustentável para a vida na Terra. A degradação passou a ameaçar o bem-estar e a qualidade de vida humana. Porém, a problemática ambiental só passou a ter importância após a conscientização da finitude dos recursos naturais e do desequilíbrio causado pelo processo de produção em larga escala em nome do desenvolvimento econômico.

Segundo CANEPA (2004), operou-se um “distanciamento da visão antropocêntrica radical para a aceitação de um “antropocentrismo alargado”, no qual se constata uma responsabilidade social perante o meio ambiente, o que é plenamente amparado no direito brasileiro”.

A Constituição Federal, em seu artigo 225, caput, prevê o direito ao meio ambiente equilibrado, como bem de interesse da coletividade e essencial à qualidade de vida. “Nessa articulação entre meio ambiente e qualidade de vida se estabelece o que se pode denominar de “teleologia antropocêntrica” (CANEPA apud LEITE, José Rubens Morato et alli).

Vê-se, portanto, que as normas de Direito Ambiental, nacionais e internacionais, cada vez mais reconhecem direitos próprios da natureza, independentes do valor que esta possa ter para o ser humano. Esse pensamento, aliás, encontra guarida nas disposições constantes da Resolução 37/7, de 28/10/1982, proclamada pela Assembléia Geral da ONU, que estipulam que “toda a forma de vida é única e merece ser respeitada, qualquer que seja a sua utilidade para o homem, e, com finalidade de reconhecer aos outros organismos vivos este direito, o homem deve se guiar por um código moral de ação”. Isso, todavia, não quer dizer que a pretensa superação do antropocentrismo radical implique uma modalidade de irracionalismo, capaz de colocar em pé de igualdade o homem e os demais seres vivos, rebaixando o valor da vida humana para transformá-la em algo sem valor em si próprio.

A educação ambiental por meio das leis deve buscar o reconhecimento do ser humano como parte integrante da natureza, que não tenta subjugá-la, mas que pretende estabelecer a normatividade da harmonização entre todos os componentes do mundo natural culturalizado, no qual, a todas as luzes, o ser humano desempenha papel essencial, como ensina Paulo de Bessa Antunes (2001).

Aliás, a nova concepção de ecologia, associada ao movimento popular global encabeçado pelo filósofo norueguês Arne Naess, no início da década de 70, conhecido como ecologia profunda, vê o mundo “não como uma coleção de objetos isolados, mas como uma rede de fenômenos que estão fundamentalmente interconectados e são interdependentes. A ecologia profunda reconhece o valor intrínseco de todos os seres vivos e concebe os seres humanos apenas como um fio particular na teia da vida” (CANEPA, apud CAPRA, Fritjof).

O Direito Brasileiro reconhece à natureza direitos positivamente fixados. Isto ocorre tanto ao nível de norma constitucional, quanto ao nível da legislação ordinária. Muito embora haja uma obrigação social para com os processos ecológicos essenciais, que se reflete no dever do Estado em empenhar-se na preservação das espécies da flora e da fauna, pouco importando se ambas tenham utilidade imediata para o ser humano, muitos cidadãos desconhecem esse direito. Assim, à medida que se efetive a educação ambiental voltada para esta legislação específica é que se dará o reconhecimento e o respeito aos direitos da natureza, o que possibilitará, como conseqüência, a maior capacidade de reconhecer, assegurar e tornar efetivos os direitos dos próprios seres humanos e da humanidade em geral.

“Poucos danos ao meio ambiente são mais devastadores e mais perenes do que o profundo desconhecimento da coletividade das possibilidades de participação nas questões do meio ambiente para melhoria da qualidade de vida” (CANEPA, 2004).

A incorporação das leis no Brasil ao processo educacional, de forma permanente, pode ajudar a alcançar as metas de prevenção tão importantes para o equilíbrio do meio ambiente. Dessa forma, as leis podem constituir importante ferramenta para o correto manejo dos recursos naturais e para o gerenciamento ambiental responsável. Vale lembrar que é apenas por meio do exercício da cidadania e da democracia, em que os indivíduos reconhecem pertencer a uma estrutura social dotada de direitos coletivos cada vez mais presentes, que se poderá construir novos valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas à sustentabilidade e à qualidade de vida de todos os seres que habitam o Planeta.

EDUARDO SANCHOTENE BEHEREGARAY Advogado da União/PSU/Rio Grande-RS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, GENEBALDO FREIRE. Atividades Interdisciplinares de Educação Ambiental. Global. 1994. DIAS, GENEBALDO FREIRE. Educação Ambiental. Princípios e Práticas. Gaia. 3 ed. 1994. RUSCHEINSKY, ALOÍSIO et alli. Educação Ambiental. Abordagens Múltiplas. Artmed. 2002. VIANNA, AURÉLIO et alli. Educação Ambiental. Uma abordagem Pedagógica dos Temas da Atualidade. Cedi/Crab. 2 ed. 1994. MACHADO, PAULO AFFONSO LEME.Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros. 9 ed. 2001. ANTUNES, PAULO DE BESSA. Direito Ambiental. Lumen Juris. 5 ed. 2001. KOFF, ADÉLIA MARIA NEHME SIMÃO E. Curso de Educação Ambiental: uma introdução à gestão ambiental portuária. Marinha do Brasil. Diretoria de Portos e Costas Editora, 2003. CANEPA, CARLA. Educação Ambiental: ferramenta para a criação de uma nova consciência planetária. Revista de Direito Constitucional e Internacional. Ano 12. N. 48. Editora Revista dos Tribunais. 2004. SILVA, JOSE AFONSO DA. Direito Ambiental Constitucional. Malheiros. 4a ed. 2002. Site do Ministério do Meio Ambiente. http://www.mma.gov.br. Acesso: Nov. 2004.